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O equívoco de definir a importância das áreas de conhecimento a partir do impacto no PIB

Atualizado: 4 de mai. de 2020

Eduardo Borges. pesquisador doutorando do LAPES


25 mil bolsas foram disponibilizadas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) para o período entre Agosto de 2020 e Julho de 2021. Elas serão oferecidas no âmbito do Programa Institucional de Iniciação Científica (PIBIC) por meio de chamada pública para Instituições Científicas, Tecnológicas e de Inovação (ICTs) e Instituições de Ensino Superior (IES), públicas e privadas.


O ponto mais destacado do anúncio é a prioridade concedida a algumas áreas do conhecimento.  O Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicação (MCTIC), por meio das Portarias  nº 1.122, de 19.03.2020 e nº 1.329 de 27.03.2020, especificou que pesquisas “científicas e tecnológicas” terão preferência. 


Projetos de pesquisa básica, Ciências Humanas e Ciências Sociais só seriam contemplados por bolsas do PIBIC caso contribuam, em algum grau, para o desenvolvimento das Áreas de Tecnologias Prioritárias do MCTIC. Assim, pesquisas nessas áreas que foquem em outros temas deverão ser desenvolvidas com recursos próprios dos pesquisadores ou das Instituições de Ensino. Como se sabe, a distribuição social dos estudantes varia muito com as áreas. Sendo assim, a medida tende a atingir justamente estudantes de menor renda e que, sem bolsas, não poderiam ter acesso à Iniciação Científica nem se dedicar a carga horária de 20 horas semanais, pois grande parte precisaria conciliar as disciplinas regulares de seus cursos e a pesquisa com inserção no mercado de trabalho. Sem o apoio financeiro ficaria inviabilizada a participação em atividades de Iniciação Científica.


A despeito das possíveis boas intenções da medida, esta aumentaria a desigualdade em cursos que, tradicionalmente, recebem maior quantidade de estudantes que necessitam de apoio institucional para inserção na comunidade acadêmica e científica. Além disso, ainda que não seja o objetivo do Ministério, a medida pode reforçar no imaginário social a hierarquização dos conhecimentos e áreas de estudo, colocando as pesquisas em Ciências Humanas e Sociais na base de uma pirâmide como se “fossem menos importantes” para o Brasil da mesma forma que seus estudantes e profissionais.

Além das contribuições econômicas e sociais das pesquisas em todas as áreas do conhecimento, vários trabalhos, indicam a importância das atividades extracurriculares para o combate à evasão discente na medida em que auxiliam os estudantes de graduação na formação de uma identidade profissional, incentivam o aprimoramento de conhecimentos e desejo de aprender e são uma forma de reduzir os prejuízos tanto do setor público como privado com a evasão discente. Várias gerações de pesquisadores e policy makers tiveram a IC como um ponto importante em suas trajetórias profissionais. Seria um enorme dano a milhares de estudantes que também poderiam contribuir mais para um Brasil melhor caso recebessem apoio.


É um equívoco definir a importância dos conhecimentos e áreas de estudo a partir unicamente de seus impactos na geração de “PIB” e lucro, pois conhecimentos nas áreas de humanidades e sociais (em todos seus campos de pesquisa) são relevantes para subsidiar formulação e implementação de políticas públicas no campo social e de assistência, Saúde, Educação, Cultura, Meio ambiente, dentre outras áreas estratégicas em qualquer país. Mais ainda num país que é marcado por imensa desigualdade e problemas sociais profundos. Sociedades mais educadas também podem crescer mais economicamente e tendem a ser mais estáveis.


Compreender como as sociedades se enxergam, os seus dilemas sociais e filosóficos, suas regras de sociabilidade, como os indivíduos administram suas vidas e costumes é essencial para a correta focalização das políticas públicas, e para o bem estar coletivo em sociedades livres e democráticas.


Além disso, os estudos nos campos das Ciências humanas e Sociais são importantes para a compreensão dos fenômenos sociais e humanos e auxiliam as sociedades na busca da resolução de seus conflitos sociais e individuais e na convivência harmônica. Valores e Instituições caros à sociedade ocidental como a Democracia e as Instituições que compõem o sistema econômico liberal não teriam sido possíveis historicamente sem as contribuições das humanidades e Ciências sociais.


O investimento nas áreas consideradas prioritárias é de fato essencial para o país que necessita de avanços em infraestrutura e produção de Ciência e Tecnologia. Isso não é negado por qualquer pesquisador ou estudioso com o mínimo de razoabilidade. Além disso, compreendem-se as dificuldades fiscais pelas quais o país passa. Porém, investir na compreensão de nossos problemas sociais e da dimensão subjetiva e humana da existência não é importante ou prioritário para o país? As humanidades também são de grande importância para a construção de uma sociedade harmônica, educada e com cidadãos que tenham consciência de sua História, da sociedade em que vivem e de si mesmos como indivíduos livres e como sujeitos de direitos e deveres.


#bolsaCNPq



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